de passagem


ignorando meu próprio estado e dilacerando a mim mesma novamente, eu atravesso São Paulo pelo metrô falido e farto com nada mais que uma bolsa pequena carregando cigarros e certezas que se tornarão apenas acepções imperfeitas no momento em que meus olhos encontrarem os seus. a bebida ingerida em desespero já desacelera minha coerência e as olheiras que ultimamente carrego começam a chamar atenção novamente. se causou espanto e preocupação até em incógnitos, por que você sempre pareceu tão familiarizado e apático em relação a elas? 


depois de passar de estação em estação com a cabeça embriagada em uma possibilidade de ruptura ou de fortalecimento, chego ao seu encontro, magrela e moída, e te encontro com a cabeça inclinada para um livro que ilumina suas palavras com ajuda de um abajur ao seu lado. tudo em mim arrepia, estremece e se auto destrói com a simplicidade de uma cena em que você se insere, mas dessa vez não esboço reação nenhuma e nem me aproximo. pela primeira vez, depois de encarar seus olhos desinteressados, sua postura indiferente e seguidos bons minutos de espanto por minha parte, atiro a pedra primogênita e cuspo aos seus pés o amavio que seu toque sempre me proporcionou. olho a situação, seu rosto pacífico, minhas mãos tremendo e me sinto culpada, mas não me desculpo. isso deve ser um avanço, certo? 


ao invés disso, desço as escadas às pressas, atravesso a rua deserta, me despeço de tudo que vejo e, em estado febril e eloquente, grito nossa própria despedida ao olhar para trás. mas olhando a janela que não se encontra a muitos metros acima de mim, percebo que você já havia ido embora há muito tempo, julgando pela distância a qual você se encontrava e fazia impossível com que eu conseguisse distinguir o que eram sombras e o que realmente era seu corpo, ainda lendo o livro com a cabeça abaixada e totalmente estático, mesmo depois do que fiz e da minha torcida interna para que você fosse atrás de mim. com os pulmões incendiados, a garganta raspando e minha respiração num compasso desregulado, remexo a mochila, alucinada por mais um trago do que eu levo comigo, e sorvo nossa tão conhecida trama. sem nem perceber, eu já estava voltando. minha passagem, sempre permanente, me enfurece, mas é claro que eu voltaria. e você sempre soube disso. 






-fefi

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